segunda-feira, 21 de setembro de 2009

A vida lá fora, pt. I: Luz cegante

Ele se escondeu nas sombras até não suportar mais a escuridão. Medo. Medo do claro. Medo da luz. Medo da cegueira que ela poderia lhe causar. Mas lá, além do escuro, além da parede, através da fresta sob a porta, ele ouvia a vida, respirando lentamente. Estava em coma, imersa na luz cegante, esperando pela hora de acordar. E num lapso de loucura ele se ergueu.

Movendo-se com desenvoltura pela escuridão que lhe era tão nítida, dirigiu-se à porta. E quando a simples perspectiva de abri-la estendeu-se à sua frente, suas mãos começaram a tremer, o coração acelerou. Desesperado de excitação, ele se viu dividido. Dividido entre a sede de conhecer o que o aguardava além e a vontade de permanecer para sempre no escuro, em segurança e comodidade mórbidas. Chorou. Tantas vezes aquelas paredes o haviam protegido e confortado, e agora ele as abandonava. Por dentro, ele sabia que agora as desprezava. Sabia que estavam envelhecendo, e que um dia elas ruiriam. E não queria estar lá para ver.

"Não importa, não importa", pensou. E num ímpeto, abriu a porta pesada e barulhenta, e a luz finalmente entrou. Invadiu seus olhos, que se fecharam, o cegou. Ele se ajoelhou, chorando alto, arrependido de ter feito aquilo. Chorou como chora de remorso um suicida, e só se acalmou quando começou a lentamente perceber que seus soluços agora se harmonizavam com uma respiração vigorosa, que antes era distante, vinha de fora, mas que agora se aproximava cada vez mais de seu âmago.