domingo, 20 de junho de 2010
São sempre as mesmas canções
Os acordes são sempre os mesmos. As palavras são sempre as mesmas. São sempre as mesmas canções. Desesperadoramente incompletas. E dia após dia você se olha no espelho. Ingenuamente, você espera ver ali uma saída. “Ridículo”, pensa, depois de alguns minutos de observação estéril. É óbvio que não encontrará nada. Não encontra. E sai. Ou ao menos é o que desejaria fazer.
Anda pelas ruas bufando e rosnando. E quanto mais o faz, mais sente raiva de si. Cada novo olhar trocado com a realidade é pretexto para que você se enclausure mais. Cada um que passa ao seu lado é motivo para que você finja que não passa ninguém. A irritação, contraditória, te cerca sem que você possa fazer menção de tentar sair. O ciclo é de vício e desespero.
O grito nunca soa.
A sensação é a de que o ser curioso e fascinado que havia dentro de você morreu. E tudo te incomoda. Nada mais quer te provocar paixão. A vontade é a de expor para todo o mundo a dor da sua perda. Mas mesmo o choro parece se recusar a sair. Mesmo isso parece querer se esconder de você, enquanto você tenta despejar alguma coisa, qualquer coisa, sobre o mundo ao seu redor.
Então você se anula.
Continua seu dia como se nada tivesse acontecido. Finge não querer dizer nada. Quer dizer tudo, mas não tem palavras. Faz o jogo da sua fraqueza e tenta escondê-la, ocultando sua existência. É óbvio que não consegue. E fica claro que isso de nada vale.
Só o que você quer é ter algum peso. Fazer alguma diferença. Chamar alguma atenção. Você quer achar sua voz, e continua buscando-a incessantemente.
Mas os acordes são sempre os mesmos. As palavras são sempre as mesmas. São sempre as mesmas canções.
E a incompletude é o tom da realidade.
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